O velho capitão
senta em sua mesa de costume às onze horas, pontualmente.
Chega gingando a lentos passos; a bengala amiga dita o rumo e o ritmo. Com um aceno cumprimenta a todos no bar antes de se acomodar, virado para a rua. Passa longos minutos fitando o nada antes de abrir o jornal da manhã e iniciar a releitura de alguns trechos. Não havia ordem na escolha: podia passar das crônicas ao caderno de esportes em um virar de página. Em dias nublados, olhava a seção de imóveis. Nos dias de chuva, se demorava nas notícias internacionais. Circulava com caneta-tinteiro os classificados. Terminava com zelo as palavras-cruzadas iniciadas pela manhã. Por vezes adicionava comentários ao horóscopo e às tirinhas.
Chega gingando a lentos passos; a bengala amiga dita o rumo e o ritmo. Com um aceno cumprimenta a todos no bar antes de se acomodar, virado para a rua. Passa longos minutos fitando o nada antes de abrir o jornal da manhã e iniciar a releitura de alguns trechos. Não havia ordem na escolha: podia passar das crônicas ao caderno de esportes em um virar de página. Em dias nublados, olhava a seção de imóveis. Nos dias de chuva, se demorava nas notícias internacionais. Circulava com caneta-tinteiro os classificados. Terminava com zelo as palavras-cruzadas iniciadas pela manhã. Por vezes adicionava comentários ao horóscopo e às tirinhas.
Ao meio-dia em
ponto seu almoço é servido sem alarde, enquanto ele pousa o jornal na cadeira
ao lado e tira o quepe para melhor saborear a refeição. O prato do dia é o pedido
costumeiro, porém, em dias arbitrários optava pelo que parecia ser seu prato
predileto: arroz, feijão, filé de peixe grelhado e batatas fritas. Como
acompanhamento, uma travessa abundante de salada de alface, tomate e cebola.
Comia com vagar, quase devotado.
Prorrogava em até
meia hora sua estada, assim que concluía a refeição. Por vezes bebericava um
suco de laranja, mas era mais comum pedir somente um copo d’água. Cada gole
parecia pontuado por demorada reflexão enquanto os olhos singravam a rua. Por
vezes seu olhar acompanhava os transeuntes apressados, reconhecendo ora um
rosto, ora um andar, ora uma risada. Mares de anônimos que todos os dias pegam
o mesmo trajeto, sem notar a presença do velho capitão.
Às vezes seu ritual
diário era interrompido por um aceno de conhecidos recentes, acostumados a
vê-lo em seu lugar cativo. Retribuía o aceno distraído, quase espantado.
Dificilmente alguém parava para trocar palavras, mas talvez fosse melhor assim.
Ergue-se sem
pressa, põe a cadeira junto à mesa, alcança a bengala e, após breve aceno aos
funcionários do bar, sai gingando a lentos passos. Em seu trajeto, cantarola
baixinho trechos de canções antigas. Velhas canções do mar. Ao dobrar a esquina
sua presença desaparece, retornando pontualmente às onze horas do dia seguinte.
(Escrito
originalmente entre 24 e 27/11/2017)
Nossa, Camila! Que texto fantástico! Se alinha perfeitamente com algo que estou tentando terminar! Gostei muito do que li. Parabéns!
ResponderExcluirPuxa, Camila! Que texto fantástico! Gostei muito da descrição do Capitão, e o texto se alinha perfeitamente com algo que estou escrevendo (uma letra). Parabéns!
ResponderExcluirObrigada, Diego! Estava meio receosa de pôr esse texto no ar, já que ele não faz parte de nenhum desafio, mas aí me lembrei que eu decidi criar esse blog justamente pra isso, então...
ExcluirE sério? Hahahahahahahah que divertido! Avise se a letra ganhar forma, hein?
Beijos!
Que lindo texto, amor! Ele exemplifica bem quando te disse que gosto de ler o que escreves pq é sempre convidativo e gostoso. ^^
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